23/03/2009

Queda

Em momento de queda, como quando se tropeça, a caminho do chão, enche-se a memoria de prazer. [Porque a memoria tem prazer em recordar e tem a capacidade de só recordar as coisas boas que interessam lembrar.] A caminho do chão, em milésimas de segundos, lembras-te do primeiro sorriso que recebeste daquele menino de olhos cor de mel. Lembras-te do primeiro amor, do primeiro beijo. Lembras-te daqueles dias azuis. Lembras-te das coisas boas e, recordas o que aprendeste com as coisas más. Em queda despropositada, a caminho do chão, levas as mãos à frente para te proteger, porque mesmo quando escolhes cair há algo em ti que resiste a tua vontade de destruição. Há algo em ti que quer viver, algo que quer mais uma hipótese de sorrir. Já perto do chão e, da dor inerente à tua escolha, tens tempo de te arrepender. A queda traz um silencio ensurdecedor e o impacto final é atordoante. Deixas de ouvir, deixas de ver, perdes todos os sentidos. Na tua escolha, pouco pensada, recebes o silencio e a falta de sentir. E no escuro em que mergulhas pedes baixinho só para ti, que possas voltar a erguer-te, nem que seja para escolheres cair noutro dia qualquer, porque até da queda final queres tirar partido e, não é justo não sentir a dor de cair.
Quando acordas sentes um trago amargo na boca e, provas do teu sangue. Estas machucada, ferida, dorida, magoada. Mas continuas a ter mais dias azuis para viver.
Voltas a erguer-te e esperas pela próxima queda.

2 comentários:

  1. Muito bom o texto... faz-me lembrar uma música.
    Mafalda Veiga - Um pouco de céu.

    "É que hoje parece bastar um pouco de céu."
    (n sou anónimo, mas n me apeteceu identificar :x ja deves saber)

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  2. você faz com que eu me entenda um pouco mais a cada texto.

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